Lamento discordar daqueles que se entusiasmam por estes dias com os confrontos televisivos entre os candidatos a Belém: do que necessita imperiosamente a democracia por estes dias é de acção, pois que debate público temo-lo profusamente mais ou menos interessante nas rádios e televisões, nos jornais e na Internet. Quase todos os dias nos é oferecido um vasto menu de políticos, politólogos e jornalistas a debater propostas e ideias para Portugal. Não há notícia de relevância à qual não sejam chamados à colação especialistas do pró e do contra. É uma barrigada constante de debate, muitas das vezes protagonizada por políticos agrilhoados nas agendas dos seus paridos, coisa que resulta numa restrição argumentativa e de ideias simplesmente confrangedora. É nesse modelo discursivo que se inserem os candidatos à presidência, ostensivamente demagógicos, debitando provocações estéreis, promessas ilegítimas sobre matéria em que constitucionalmente são impotentes… e o auto-elogio, meu Deus, que atinge uma patética desfaçatez.
Dito isto, gostava de deixar expresso que considero que o vencedor antecipado, Cavaco Silva, simboliza o lado idílico (que não me convence) daquilo que uma república tem para nos oferecer: a ascensão duma pessoa de origem social modesta e geograficamente periférica ao topo da hierarquia do Estado. Em última análise esta promoção personifica a consumação do mais alto desígnio duma democracia, bandeira antes tão querida duma Esquerda que hoje é dominada por uma casta aburguesada e pretensiosa que adivinha no presidente Cavaco as suas envergonhadas origens rústicas, um Portugal real que injustamente desprezam por complexos sociais. Depois, parece-me injustificado o rancor ao presidente corporizado por uma certa direita que desse modo projecta as suas frustrações para a pessoa do presidente, quando o problema está na natureza do cargo, que é basicamente inútil. Bem que eu gostaria de perceber em que se consubstancia esse famigerado “magistério de influência”: imaginem os problemas de consciência e hesitações com que o José Sócrates se foi debatendo de cada vez que saía dos seus encontros em Belém ao longo do seu desastroso mandato…
É por estas e por outras que, confesso, me custa muito ter de aturar o circo que por estes dias se levanta, as polémicas estéreis e promessas vãs, os recursos e energias inúteis que este País à beira da falência se prepara para desbaratar. O Presidente da república é cargo de fraco valor simbólico, um árbitro recrutado a uma das equipas a quem houve a sensatez de retirar o apito e os cartões para não chatear muito. De resto espera-se que esta farsa insana pela nossa saúdinha se decida à primeira volta, pois que se houver segunda eu emigro.
Aqui chegados, nós portugueses temos aquilo que merecemos: somos um povo descrente, uma Nação em acelerada dissolução sem ideal ou utopia, e o espectáculo proporcionado pelos candidatos a Belém é profundamente estéril e depressivo. Prodígio que será confirmado nas urnas em Janeiro, e para o qual eu contribuirei com um a expressão de um voto Nulo com um “Viva a Monarquia, Viva Portugal”.
Termino voltando ao que realmente importa: um Santo Natal, são os meus sinceros votos.
Esta terceira república está a bater no fundo e não apenas por razões de má gestão pública. Quer queiramos quer não, quer gostemos quer não.
O sistema instituído na Constituição Política de 1976, com algumas correcções posteriores em sucessivas revisões, já provou à saciedade que não serve. O semi-presidencialismo inventado pelos constituintes é um arremedo do constitucionalismo monárquico em que o rei reinava e não governava, detinha o poder moderador, era o árbitro acima dos partidos. Neste sistema republicano o presidente “presidencia” e não governa – embora ridiculamente se apresente com um programa que, por invadir a esfera do governo, se sabe que não pode cumprir -, exerce aquilo que diz ser a “magistratura de influência”, e não pode ser árbitro porque pertenceu, antes da sua eleição, a uma das equipas, quer ideológica quer partidária. Longe de contribuir para a estabilidade que, teoricamente, facilita e gera melhor governação, faz parte do conflito institucional, mais ou menos subterrâneo, mais ou menos visível. Na nossa terceira república com a agravante ainda de os presidentes eleitos, com excepção do primeiro, terem tido responsabilidades na área governativa e autárquica e trazerem para a chefia do Estado, para o bem e para o mal, a memória do que realizaram enquanto governantes e autarcas.
O semi-presidencialismo mitigado português, bebido na realidade francesa mas refreado nos poderes presidenciais em 1976, e mais ainda na revisão de 1982, pretendeu corrigir tanto os sistemas da primeira república, parlamentar com a deriva autoritária do efémero presidencialismo sidonista, como o da segunda república autoritária. Só que não quis entender que a verdadeira questão esteve desde sempre na chefia do Estado electiva: o presidente nunca pode ser um factor de equilíbrio entre poderes, quando o seu próprio poder constitucional tem a mesma origem, quer seja eleito pelos partidos no Parlamento, quer seja eleito por sufrágio directo com o apoio dos partidos.
A braços com uma crise económica que é, sem dúvida, a maior e mais grave dos cem anos do regime republicano – e não vale a pena culpar apenas ou sobretudo a conjuntura internacional – o país político vai-se entretendo com as eleições presidenciais que ocorrerão em Janeiro de 2011 mas que já se iniciaram na prática há um ano, com os candidatos a perfilarem-se para o sufrágio e a serem confrontados com a memória do passado, mais ou menos recente, a ser exposta na praça pública, porque quase todos têm ou tiveram responsabilidades na situação a que o país chegou. Nenhum está isento de responsabilidades, maiores ou menores.
Manuel Alegre, o primeiro a manifestar a vontade de se candidatar, foi desde 1974 deputado do Partido Socialista – com breve passagem por uma Secretaria de Estado – e apesar das suas discordâncias, nunca deixou de apoiar o seu partido e as suas políticas governativas. E sobre ele recaem ainda as suspeitas, fundamentadas ou não, de ter colaborado activamente com forças inimigas durante a guerra colonial, pondo em perigo a acção das Forças Armadas e a vida de muitos jovens militares nela participantes. É bom lembrar que o presidente da república é, também, o Comandante Supremo das Forças Armadas. É apoiado pelo PS e pelo BE.
Defensor Moura, também vindo da mesma área política, apoiou igualmente o partido que lhe possibilitou ser autarca e deputado. Tem escassos apoios na área socialista.
Fernando Nobre, que se diz da área ideológica da esquerda, nunca teve responsabilidades políticas, mas apesar de criticar muitos aspectos da acção dos vários governos, nunca quis assumir qualquer responsabilidade efectiva. O seu capital são as meritórias actividades humanitárias. O seu “handicap” o desconhecimento da gestão da coisa pública e a suspeita de ter trocado as simpatias monárquicas pela defesa da república por interesse. Não tem apoios partidários, mas curiosamente o de alguns monárquicos.
Cavaco Silva, presidente e recandidato, tem no seu passado o ter sido Ministro da AD e Primeiro-Ministro e o de ser um dos responsáveis pela situação do país, quer pela sua acção enquanto chefe do governo, quer pelo desempenho das funções presidenciais onde, a par da “colaboração estratégica” com o actual governo, criou situações de tensão com o mesmo governo em episódios lamentáveis como o da espionagem à Presidência da República pelo governo. É apoiado pelo PSD e pelo CDS.
Fica, assim, patente, que o Chefe do Estado que vai ser eleito será mais uma pessoa comprometida com o descalabro deste regime, comprometida com os partidos, ele mesmo parte de uma facção ideológica e política que, por milagre laico e republicano, se quererá converter em “presidente de todos os portugueses”.
A terceira república - cuja principal virtude foi restaurar a democracia caída em 1910 - que se quis redentora dos erros das anteriores, ao prosseguir com o seu principal erro – a chefia do Estado electiva que nunca pode ser independente e supra-partidária, mas está comprometida com o passado e o presente da gestão do Estado, por acção ou omissão – está condenada a termo. E talvez esse termo seja menos longo do que muitos julgam.
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