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BLOGUE REAL ASSOCIAÇÃO DE LISBOA

O Brasil deitado ao chão

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Evidentemente que o problema do Brasil estará a montante do presidencialismo vigente, mas fico com a ideia de que o sistema não ajuda nada, antes pelo contrário. A somar a tudo isto, porque dois males nunca vêm sós, verifica-se que, por contingências que mereceriam outra análise mais profunda, a disputa presidencial se dá entre dois absolutos desqualificados institucionais: um esquerdista venal e outro boçal populista. Venha o diabo e escolha, ainda bem que não tenho de resolver o dilema.

Como em Portugal, no Brasil o Chefe de Estado também é um chefe de facção, que a cada eleição deixa uma significativa parte das comunidades nacionais órfã de representação, com a agravante de acumular a chefia do governo. Num sistema complexo como o brasileiro, um país descomunal, de frágeis instituições e precária homogeneidade geográfica étnica e cultural, persistentes índices de desigualdade e pobreza endémica, a democracia clama por uma figura agregadora e consensual. E não nos esqueçamos que foi a monarquia bragantina que vigorou por três gerações que criou esta potência mundial, a quinta maior democracia do mundo – o milagre brasileiro, eterna promessa.

Quem assistiu ao debate eleitoral de ontem não terá conseguido evitar um calafrio na espinha perante tanta despudorada alarvidade esgrimida. Sempre precária e tumultuosa, os testemunhos que nos chegam, é de que a democracia brasileira chega a 2022 com o país multifracturado, num clima insalubre de conflitualidade, que as eleições de domingo vêm exponenciar, arriscando-se acender o rastilho da violência ou da tirania. Isto tudo porque o povo brasileiro tem de escolher uma de duas figuras tóxicas e sectárias. Rezemos então a Deus que afinal é brasileiro, pois os tempos reclamam por um novo milagre.

A pátria com figura humana *

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A esquerda radical, numa reacção pavloviana, reagiu poucos dias depois da morte da rainha Isabel II incomodada com o espectável dilúvio mediático resultante do acompanhamento das cerimónias fúnebres e de transição na monarquia – pena é que não tenhamos mais oportunidades de abordar o tema subjacente. Nesse sentido, são exemplos os artigos de Daniel Oliveira no Expresso e Carmo Afonso no Público que, vexados, verberam contra a forma de governo monárquica, desprezando o facto de os países onde o sistema vigora serem dos melhores exemplos de avanço democrático.

Carmo Afonso usa até uma abordagem original, congratulando-se com os azares dos monárquicos em Portugal, como com a expropriação dos bens da Casa de Bragança por Salazar, do “perfil humilde” e “discreto” do Duque de Bragança, não referindo a abolição da monarquia constitucional portuguesa e a instauração de uma república, ditatorial, violenta e sempre minoritária no apoio popular, pela força das armas, ou o cobarde assassinato do Rei Dom Carlos e do seu jovem filho o Príncipe Real dois anos antes, práticas políticas que a colunista por certo aprova.  

Como os antigos jacobinos ou os soviéticos mais tarde, os dois colunistas acreditam profundamente que a natureza humana, onde ancora a atracção das pessoas pela instituição monárquica e os seus rituais, é moldável. A construção de um “homem novo” que “considere a existência de famílias reais uma afronta” é um idealismo perigoso que, estranhamente, no século XXI ainda seduz demasiados activistas da nossa praça. Como no final da monarquia em Portugal, são poucos, mas ruidosos.  

Percebe-se como a morte de Isabel II tenha colocado na ordem do dia e inundado o espaço público com relatos, imagens e testemunhos insuspeitos sobre as qualidades do regime monárquico. Afinal a “rainha de Inglaterra” fez a diferença. Não sei se será surpresa para os progressistas constatarem que sempre que se mudaram os regimes à força, apesar do sangue derramado, não conseguiram mudar as mentalidades como tinham idealizado. Ao menos o sonho de John Lennon no seu castelo de marfim, ficou-se por uma bonita e inconsequente canção: continuarão a existir países, religiões, propriedade, paraíso e inferno… enquanto existirem pessoas.

Ora, as monarquias existem porque a esmagadora maioria pessoas não comunga dos ressentimentos sociais e das ideias políticas dos danieis oliveiras e das carmos afonsos da vida. Do Daniel Oliveira, que se faz distraído confundindo votos com legitimidade, sabe-se que se viu obrigado a arrumar o seu passado político no PCP numa gaveta funda quando não era mais possível esconderem-se os milhões de vítimas do comunismo que professava. Nesse sentido convém responder à pergunta: qual a razão dos noticiários darem tanta atenção às exéquias da rainha de Inglaterra e à transição em curso na coroa britânica? Porque o público é sensível e adere ao drama humano e à beleza estética que emana desta poderosa instituição e dos seus rituais. Porque a instituição real é profundamente humana, até nas suas contradições. E o povo britânico (para não ir mais longe) identifica-se esmagadoramente com a Família Real como se fosse a sua.

Mas que isso não aflija os revolucionários de serviço: ao contrário das ditaduras progressistas, as monarquias são reféns da vontade popular, e assim persistiram ao longo dos séculos com uma extraordinária capacidade de adaptação. E perseverarão enquanto as nações permanecerem humanizadas, alicerçadas em famílias e em comunidades livres, a resistir ao individualismo radical, que tudo fractura e atomiza numa epidemia de microcausas, guerreando-se, enfim, numa barbárie que sempre espreita a oportunidade para vingar.

Em homenagem à era isabelina tudo e mais alguma coisa já foi dito nos jornais, rádios e televisões, e o assunto continuará a ser escalpelizado durante os próximos dias, pelo que duvido que aqui consiga dizer aqui alguma coisa de verdadeiramente original. Além da grande admiração que nutro pela rainha e pela coroa britânica, que no mundo se mantém estandarte dos valores ocidentais da liberdade e da democracia com que me identifico incondicionalmente, como monárquico, tem sido para mim particularmente reconfortante assistir, no debate que acompanha as impressionantes cerimónias, ao enorme consenso sobre a qualidade e pertinência das monarquias da velha Europa civilizada. Já é para mim um mistério por que domesticamente são tão poucos os que retiram daí as devidas ilações.

Impressionou-me particularmente a chegada do Rei Carlos III a Buckingham, no seu primeiro contacto com a população perplexa, após a morte da sua querida mãe. Sentia-se ali um misto de dor e de esperança na continuidade, personificada pelo novo rei. Uma projecção da transcendência aspiracional que é cimento das comunidades robustas. Impressionou-me adivinhar nessa multidão a grande diversidade de etnias e culturas que compõem por estes dias o Reino Unido e o enriquecem e que nem por isso deixaram de partilhar o mesmo sentimento de perda e a mesma confiança na continuidade.

Curioso é como o Reino Unido, que enfrentou tantos desafios trágicos e tormentas nos últimos 70 anos, se, por um lado, perdeu um império, afirmou-se como uma potência cultural no mundo inteiro, muito desproporcional ao seu peso geopolítico. E a mensagem subjacente, nas artes, na literatura, no desporto, na música popular, no audiovisual, vem sendo genuinamente boa: é de civilização.

O reinado de Isabel II, a Rainha global, deixa ao planeta inteiro esse legado. Já o Rei Carlos III tem todas condições para contribuir para que o Reino, Unido enfrente tal como o seu nome o indicia, as tempestades que se perfilam adiante daquela complexa realidade multinacional e multicultural: sejam os separatismos ou a crise económica que se espera que seja muito dura. Mas de quem tenho mais pena é das republiquetas revolucionárias do sul da Europa, que não souberam resistir ao canto das sereias dos revolucionários, convencidas que estão que é possível moldar a natureza humana e as suas afeições. Nem que seja à força.

Coitados de nós, que temos aquilo que merecemos.

*Ver o rei na sua força calma é ver a pátria com figura humana
António Sardinha

Publicado originalmente aqui

A Real Associação de Lisboa é uma estrutura regional integrante da Causa Real, o movimento monárquico de âmbito nacional. Esta é uma associação que visa a divulgação, promoção e defesa da monarquia e da Instituição Real corporizada na Coroa Portuguesa, cujos direitos dinásticos estão na pessoa do Senhor Dom Duarte, Duque de Bragança e em quem legitimamente lhe vier a suceder. Cabe a esta associação a prossecução de iniciativas e de projectos de interesse cultural, social, assistencial e de solidariedade que visem a dignificação, a valorização e o desenvolvimento dos seus associados e da comunidade em que se insere.

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