Durante o ano do centenário da república, a imprensa portuguesa publicou inúmeros artigos sobre a monarquia, tendo em consequência deixado de ser tabu o debate Monarquia versus República.
Por outo lado, as enormes dificuldades que o nosso país atravessa, com uma crescente e generalizada perda de qualidade de vida, obriga os portugueses a questionarem-se cada vez mais sobre o nosso regime actual. Facto é que, na maioria dos debates, mesmo os republicanos mais fanáticos admitem vantagens que um regime monárquico poderia trazer para Portugal.
Aliás, os argumentos republicanos contra a monarquia acabam sempre por ficar reduzidos à pretensa livre escolha do presidente e à não aceitação da sucessão hereditária. Estes dois argumentos têm no entanto sido contrariados e até desmistificados pela história recente, sendo reconhecida a partidocracia da eleição presidencial. Acresce que a generalidade dos defeitos atribuídos ao regime monárquico do passado, tornaram-se hoje ainda maiores, mais graves e visíveis, não nos podendo esquecer que os regimes monárquicos também foram evoluindo, naturalmente para melhor, como se pode observar nos países europeus onde existem monarquias. E não são os “escândalos” que os média se deliciam a publicitar que afectam e põem em questão o bom funcionamento das monarquias europeias actuais.
Prova que o nosso movimento está mais forte é a circunstância de os republicanos se preocuparem em dificultar cada vez mais o nosso crescimento com muitas acusações deturpadoras e pretensamente dissuasoras do nosso ideário.
Se houvesse uma mudança de regime, a restauração da Monarquia em Portugal traria muitos benefícios para o país, sem implicar quaisquer mudanças fundamentais nas áreas da vida pública. Ao Rei competiria escolher para chefiar o governo, o representante do partido mais votado no parlamento, o que seria uma função semelhante à do Presidente da Republica, com os direitos e obrigações conferidos pela constituição. Por outro lado, a democracia e a representatividade dos cidadãos não seriam postas em causa, sendo asseguradas por periódicas eleições directas e universais, tanto legislativas como autárquicas.
A existência da Instituição Real traria para o país vantagens evidentes, sendo de destacar as seguintes:
- O Rei e a Família Real constituem um elemento de agregação para todos os portugueses, personificando e simbolizando a soberania da Nação, assim como o passado colectivo e a herança cultural dos portugueses.
- A identificação histórica da pessoa do Rei com a Nação confere um maior prestígio e reconhecimento internacional à representação de Portugal pelo Rei.
- O Rei não necessita de ser eleito com o apoio dos partidos políticos, sendo independente do apoio de interesses ou grupos de pressão políticos, económicos ou quaisquer outros.
- Sendo ideologicamente independente, a isenção e a liberdade do Rei são garantia dos direitos e da liberdade dos cidadãos.
- O Rei, ao constituir um factor de unidadena diversidade e de garantia de continuidade, favorece a estabilidade política.
- Constituindo, ainda, uma forma de organização política tradicionalmente e comparativamente mais económica do que a República.
O poder do Rei vem do povo e é um forte sinal de que Portugal está vivo.
A elevação de D. Manuel II ao trono foi tão abrupta, que não houve tempo para se reunir em volta dele nenhum desses grupos que gravitam perto dos príncipes herdeiros, com um vasto e ambicioso programa de reformas destinado a mudar a feição do país. Por isso o seu reinado ficou preso a uma classe política gasta, operando num ambiente degradado. No entanto, apesar das circunstâncias que concorriam para apagar a sua personalidade política, o jovem monarca revelou uma aguda consciência ética e estratégica sobre o modo como devia desempenhar-se da sua missão dinástica e salvar a monarquia. O primeiro acto da vontade régia, pôr termo à experiência franquista e inaugurar a política da “acalmação”, foi aquele que ficou marcado na memória histórica como a feição característica do seu reinado, e constituiu sem dúvida um sinal de fraqueza do regime, que o partido republicano estava preparado para explorar. Se a actuação política de D. Manuel se tivesse reduzido a esta substituição de uma política por outra, a sua herança histórica seria um traço de inabilidade estratégica, embora firmado com uma vontade forte. Mas foi muito mais longo o alcance do seu pensamento e da sua acção.
A vontade de romper o cerco em que a política rotativista o encarcerava foi um dos traços mais salientes da sua actuação enquanto rei. Empenhado em cumprir os seus deveres de soberano católico, procurou fazer-se o advogado das classes pobres junto do governo, e para isso abriu uma ligação directa ao seu povo, correspondendo-se pessoalmente com os dirigentes do movimento operário, Azedo Gneco e Aquiles Monteverde, que lhe transmitiam as impressões recolhidas nos meios mais indigentes. D. Manuel recolhia essas notas e transmitia-as aos seus ministros, que sem pressas nem excesso de zelo iam adoptando algumas das recomendações régias. Na opinião do rei, ao imperativo moral de melhorar as condições de vida dos mais pobres, juntava-se o imperativo político de subtrair os operários à influência da propaganda republicana, explorando as divisões entre o movimento operário e o partido republicano. Neste ponto mostrava uma apurada sensibilidade política, pois o conflito entre as duas forças era profundo e veio a rebentar com violência durante a vigência da república.
Mais ambicioso do que este plano, e procurando atingir o âmago das fraquezas nacionais, foi o empenhado esforço com que D. Manuel se debruçou sobre o vasto inquérito encomendado ao sociólogo francês Léon Poinsard. Esta autêntica sumidade da escola de Frédéric le Play, que iniciara os estudos de campo em sociologia, deslocou-se a Portugal em 1909, com a incumbência de procurar as razões profundas do estado de decadência em que o país se atolara. Viajou de Norte a Sul, estudou os mais variados meios sociais, familiarizou-se com os meios citadinos e rurais, leu a história portuguesa e consultou a mais moderna investigação etnográfica sobre o modo de vida material, cultural e religioso de cada província. Apurou dados estatísticos e económicos, comparou a divisão da propriedade nas várias regiões, e produziu no final um diagnóstico tão profundo como até então não se conhecera, sobre o estado social da nação portuguesa. O estudo de Léon Poinsard, publicado em livro com o título de “Portugal Ignorado” (1912), ficou concluído depois da mudança de regime, e leva no fim uma nota sobre os últimos acontecimentos políticos.
O diagnóstico de Léon Poinsard revela causas históricas e sociais na raiz dos problemas portugueses, vendo na instabilidade política e na debilidade do tecido económico as consequências de um mal mais profundo – a secular desorganização da sociedade, alicerçada numa estrutura familiar sem grande consistência. Portugal é caracterizado como um país que desde vários séculos atrás “se desviou do regimen normal do trabalho”, por circunstâncias históricas como a expansão ultramarina , a abundância de escravos ou a ociosidade das classes dominantes. “Poucas nações teem passado por circumstancias desorganizadoras tão profundas e contínuas como as que o povo portuguez tem sofrido”. Passando em revista as soluções que os sucessivos governos adoptaram ao longo dos tempos para contrariar a estagnação e decadência da nação portuguesa, mostra a pouca eficácia e o curto alcance das políticas adoptadas, por não atacarem as raízes do problema. E aponta as necessidades do país, destacando, de todas elas, a prioridade maior: a reconstituição da estrutura da família portuguesa.
No interior do livro deixa um apontamento sobre a atenção que o rei D. Manuel dedicou áquele inquérito, não apenas acompanhando os passos da investigação, mas definindo-lhe mesmo alguns dos objectivos. Reconhecendo que o rei era mediocremente aconselhado e não tinha experiência nem autoridade para dominar os partidos, impondo-lhes reformas profundas, acrescenta que ele “era animado das melhores intenções e do mais vehemente desejo de exercer inteligentemente e com utilidade para o paiz as suas elevadas funcções de rei”, revelando depois: “Tomara grande e directo interesse pelos nossos estudos sobre Portugal e empenhara-se por conhecer-lhes prontamente o resultado. Tivemos de responder minuciosamente a uma serie de perguntas redigidas pelo seu proprio punho e que denotavam uma intelligencia muito viva e uma precoce circunspecção de espírito pouco vulgar na sua idade”.
Dada a curta duração do reinado de D. Manuel, ficam-nos apenas indícios como este, para conhecermos o que poderia ter sido o manuelismo no seu período reinante. O outro manuelismo, que se definiu penosamente no exílio, lutou durante 22 anos para se fazer ouvir pelos seus mais zelosos servidores. Depois de 1910, as relações de D. Manuel com as suas hostes formaram uma tortuosa trama, feita de desencontros entre os ímpetos guerreiros dos segundos e o tranquilo planeamento político do primeiro. O rei via o movimento monárquico como um agrupamento político unido, pacífico e ordeiro, com um chefe nomeado por ele, e servido por jornais que explicassem claramente a visão política do monarca. Mas os seus fiéis não aceitavam impávidos os enxovalhos que a república lhes infligia, respondiam ao golpismo republicano com monárquico golpismo, e aclamavam um chefe, que não o escolhido pelo rei.
Os acontecimentos do 5 de Outubro douraram o perfil de Paiva Couceiro com as cores do heroísmo, erguendo-o ao papel de supremo paladino da monarquia, o único oficial que se batera com denodo no meio da cobardia generalizada. Espontaneamente foi tomado por chefe dos monárquicos e olhado como o comandante natural de qualquer movimento restaurador. Couceiro tomou o lugar que a opinião pública lhe conferia e norteou o movimento monárquico para a via da conspiração armada. Contrariava assim a vontade política do rei exilado, que sempre afirmou pretender o seu regresso quando fosse chamado ao trono pela vontade da nação, livremente expressa. Deve notar-se que semelhante exigência parecia uma abdicação. No regime que se vivia em Portugal, não se vislumbrava possibilidade alguma de essa condição se reunir, pois a república não mostrava o mais leve empenho em consultar a vontade da nação, ou em permitir que esta se exprimisse por qualquer meio que fosse.
O inesperado triunfo da república mostrara que uma vitória pela força das armas arrasta consigo, nos dias posteriores, uma onda de conversões e adesões espontâneas, que ajudam a consolidar o terreno conquistado. Por isso, a doutrina prevalecente no campo monárquico, mesmo entre aqueles que mais acreditavam nas virtudes do sufrágio, como Paiva Couceiro, era a de restaurar a monarquia e depois referendá-la.D. Manuel via-se rodeado de uma hoste que se batia em seu nome sem o consultar. Foram necessários anos de porfiados esforços para que D. Manuel conseguisse imprimir a sua política ao movimento monárquico. As incursões de 1911 e 1912 foram um sinal de impotência e desorganização dos monárquicos, mas deram alento aos mais combativos, e provocaram nova onda de repressão, que fez renascer das cinzas uma imprensa monárquica mais aguerrida, pronta a enfrentar as vagas de apreensões e empastelamentos.
Em 1914 publicavam-se em Lisboa 14 jornais monárquicos, 3 dos quais dedicados à caricatura política. As arbitrariedades da governação republicana davam abundante pasto à ironia e ao sarcasmo. Mas sentia-se a necessidade de ir mais longe do que a simples publicação de comentários mordazes aos actos do poder político. O principal conselheiro de D. Manuel, Aires de Ornelas, vivendo em França, acompanhou o renascer do sentimento monárquico sob a inspiração de Charles Maurras e da “Action Française”. Admirador da obra de “saneamento intelectual” que se operava em França, graças crítica dos princípios revolucionários, o antigo ministro franquista pensou no modo de transferir para Portugal o renascimento dos valores tradicionais. Reconhecendo nas ideias revolucionárias que fermentavam em Portugal o figurino de origem francesa, facilmente deduzia a necessidade de importar também a crítica das mesmas. Em Abril de 1914 Aires de Ornelas publicava um opúsculo intitulado “as doutrinas políticas de Charles Maurras”. Mas onde ele via apenas a crítica dos princípios “revolucionários”, ou “republicanos”, podia-se ver também uma condenação do parlamentarismo e da monarquia constitucional. Tal consequência seria abundantemente explorada por um movimento, que estava prestes a irromper na política portuguesa. O Integralismo Lusitano, criado no mesmo ano, deu-se a conhecer ao público com um vasto programa de crítica e reforma da mentalidade portuguesa. Com um verbo acutilante, lançado em várias direcções, golpeava duramente a política republicana e os seus antecedentes liberais, atacando-lhes os alicerces filosóficos, científicos e sociológicos. O movimento monárquico ganhava novo poder de atracção.
Em Agosto de 1916 começou a publicar-se o “Diário Nacional”, órgão da Causa Monárquica. O manuelismo conseguia finalmente constituir-se em partido, com um jornal matutino dirigido por Aires de Ornelas, lugar-tenente de D. Manuel. A política nacional passava a ser diariamente analisada pela perspectiva monárquica superiormente orientada.
Mas em 1918 o movimento restauracionista voltou a mergulhar na via conspirativa, à margem das instruções régias. O sidonismo, apoiando-se nos monárquicos, deu-lhes a consciência da força que tinham. Largamente representados no parlamento, no governo e no exército, não estavam dispostos a deixar que o poder voltasse às mãos do republicanismo radical. A Monarquia do Norte e a revolta de Monsanto, em Janeiro de 1919, foram o resultado desta actividade conspiratória, que terminou com mais uma vitória da república, e a prisão ou o exílio dos mais activos monárquicos.
Em meados de 1919, encontrando-se a Causa Monárquica privada dos seus chefes, uma delegação do integralismo lusitano dirigiu-se a Inglaterra, onde se encontrou com D. Manuel para lhe pedir que se definisse com mais clareza sobre pontos de política e que imprimisse uma nova direcção à Causa Monárquica. O rei recusou-se a tomar como seus os princípios anti-liberais do integralismo, afirmando-se rei constitucional, e confirmou o seu lugar-tenente Aires de Ornelas, que se encontrava preso, na chefia da Causa. O integralismo lusitano, reconhecendo a incompatibilidade entre as suas doutrinas e as do constitucionalismo, de que o rei se mostrava inabalável fiador, decidiu desligar-se da obediência a D. Manuel e procurou um entendimento com o partido legitimista. A cisão não foi seguida por todos os integralistas. Houve um grupo que continuou a reconhecer D. Manuel e a militar nas fileiras da Causa Monárquica: João Ameal, Caetano Beirão, Alfredo Pimenta, António Cabral, Luís Chaves, Fernando Campos e outros, constituíram uma corrente autónoma, que veio a chamar-se Acção Realista, e a publicar uma revista de doutrina política com o mesmo nome. O integralismo mantinha assim um braço muito activo no interior da Causa Monárquica, o que trouxe a esta um clima de intenso debate ideológico ao longo dos anos 20. A juventude da Causa Monárquica lançou em 1925 a “Portugália”, revista de “tradição, cultura e renovação nacional”, dirigida por Fidelino de Figueiredo. Foi nas páginas desta revista que se iniciou uma das mais importantes controvérsias doutrinárias entre monárquicos. O Conselheiro Luís de Magalhães, procurando aplanar as diferenças entre constitucionalistas e integralistas, publicou um artigo sobre “o tradicionalismo da carta”, onde interpretava o documento basilar da monarquia constitucional como uma adaptação moderna dos princípios da monarquia tradicional, mantendo todas as prerrogativas do poder régio e conservando a representação nacional dividida que como nas antigas côrtes, pois os três estados encontravam-se representados nas duas câmaras da monarquia constitucional: nobreza e clero na Câmara dos Pares, Povo na Câmara dos Deputados. Este texto foi objecto de uma rigorosa crítica por parte de Caetano Beirão, nas páginas da “Acção Realista”, à qual Luís de Magalhães replicou com ampla argumentação, que juntou no livro “Tradicionalismo e Constitucionalismo”. A obra de Luís de Magalhães, em que Barrilaro Ruas via um dos mais altos expoentes do tradicionalismo português, é decerto a mais completa compilação da doutrina do manuelismo, e nela se pode avaliar a evolução de uma corrente política que, começando como simples profissão de fidelidade ao regime caído em 5 de outubro, foi ganhando consistência e visão crítica do período constitucional. A Causa Monárquica tinha, entretanto, recebido instruções de D. Manuel para definir com maor precisão a sua doutrina, procurando um acordo entre as suas correntes, mas mais uma vez as controvérsias entre integralistas e constitucionais fizeram arrastar a redacção do texto unificador, que esteve perto da conclusão, mas estancou quando se discutia o último ponto. O manuelismo ficou assim privado do seu manifesto definitivo, mas no caminho para o alcançar produziu suficiente reflexão ideológica para enriquecer o património do pensamento político português.
Neste mês de Outubro a república deu-nos o triste espectáculo de os Presidentes dela própria e da Câmara hastearem a respectiva bandeira de pernas para o ar.
Verdadeira metáfora do triste estado a que nos têm conduzido os partidos políticos que, sem excepção, vêm criando há quase quarenta anos, por toda a função pública, um verdadeiro “polvo” que nenhum governo consegue enfrentar, por legitimamente eleito que seja, visto não haver inocentes.
Colocada que foi a bandeira, dirigiram-se as altas individualidades para um Pátio com acesso reservado a convidados, pela primeira vez em cento e dois anos, não fossem ser incomodados pelos protestos dos Portugueses, vítimas do esbulho mais despudorado de todos os tempos, a que estão obrigados pelas exigências da Troika, pelo cumprimento do serviço da dívida pública, bem como pelo sustento voraz do já referido “polvo”.
Começando pelas P.P.Ps, Fundações Públicas e Observatórios inúteis que pouco ou nada devem ver, uma Justiça inoperante e corrupta, o auxílio a Bancos falidos por irresponsáveis esbanjamentos ou criminosos cambalachos, um Parlamento desacreditado, mal frequentado e caríssimo, com deputados que legislam, os que o sabem fazer, em proveito próprio, enfim, todo um conjunto de manjedouras corporativas, cujo primeiro responsável está hoje sentado em Belém, como garante dos nossos direitos, rodeado de assessores e de seguranças que todos pagamos, com pavor de enfrentar o Povo que o elegeu!
Que diferença, quando comparamos esta atitude com a do Rei Dom Carlos, que dizia ao seu Ajudante de Campo, pouco tempo antes de ter sido assassinado, que mesmo sabendo o risco que corria, se se metesse em casa, provocaria um grande descalabro, afirmando: “Cumpro o meu dever. Os outros, (os políticos) que cumpram o seu.”
Cumpriram. Mataram-no, proclamaram a 1ª república, lançaram o País no caos, na bancarrota e na I Grande Guerra. A tropa deu-nos a segunda, quarenta anos depois, a terceira e eis-nos aqui chegados, em cada vez pior estado, exangues e sem referências.
É caso para dizer: Biba a república! Deve ser isto o que merecemos…
«Se mandarem os reis embora, hão-de tornar a chamá-los.»
Alexandre Herculano
Não constitui a questão histórica um argumento primordial na defesa da Monarquia numa nação fundada e presidida por reis durante quase oitocentos anos, mas convém sempre relembrar que a data de hoje — e que pela última vez se celebra como Feriado Nacional — rememora o selvático assalto a um Estado de Direito constitucional por um grupo político radical e de expressão eleitoral minoritária. Desde esse dia, durante dezasseis anos e em nome de uma pretensa liberdade, os republicanos, à mistura com milícias armadas, grupos anarquistas e bombistas, ameaçaram os cidadãos comuns; vigiaram, prenderam, torturaram, degredaram e mataram, reprimindo com brutalidade todas as vozes contrárias, desde a Igreja à Imprensa. Milhares de inocentes, por discordância ou descuido, caíram-lhes nas mãos, até que o regime foi domesticado por Salazar: a censura de póstuma passou a prévia (evitando a perseguição aos ardinas e prejuízos materiais, de efeito arrasador para os jornais) e as milícias foram disciplinadas e “devidamente” institucionalizadas.
Os crimes do Regicídio (a cujo processo se deu sumiço) e da primeira república (mau grado os seus efeitos ainda permanecerem) prescreveram de facto. Os vencedores, inflamando o ressentimento tão fácil de atear num povo sofrido e iletrado, encarregaram-se de catequizar a História inventada de uma revolução idealizada, legitimando um sistema abstracto e as “boas intenções” dos seus perversos protagonistas. O ensino durante o Estado Novo completou essa tarefa.
Essa História instrumental e muito mal contada acaba pedagogicamente, mostrando que não é com revoluções, assassinatos, expatriações, erradicações ou mudança de símbolos que se mudam os hábitos, se curam os vícios e as idiossincrasias sociológicas de um povo: passados mais de cem anos, continuamos uma das nações da Europa com mais agudas desigualdades e onde a participação democrática dos cidadãos é a mais baixa. Afinal, tanto sangue, suor e lágrimas serviram para quê?
Hoje, agrilhoados a uma Constituição anquilosada e a um sistema político descredibilizado, observamos, atónitos, a repetição dos erros ancestrais. Penhorada a soberania e instalada a indigência, o cidadão descrê das elites e das instituições vigentes, controladas por obscuras máfias e grupos de interesses.
Em toda esta trágica história sobressai o legado do 5 de Outubro de 1910, um chefe de Estado, que incapaz de ser a reserva moral e a suprema referência identitária da Pátria, constitui, no nosso modelo «semipresidentalista», uma ficção de independência e autoridade, rejeitado ou ignorado pela maioria da população, um cargo envenenado pelo seu potencial de ambiguidade e conflitualidade institucional. Enfim, um semipresidente, um suposto árbitro recrutado a uma das equipas a que, houve a preventiva sensatez de retirar o apito e os cartões… excepto o vermelho: a bomba atómica, que desautoriza os deputados, legitimados pelo voto para a Casa da Democracia.
Acontece que uma Nação antiga e civilizada como a nossa deveria contar com um Parlamento condigno, um sistema colegial idóneo, onde, com veemência, se confrontassem e vigiassem os interesses, as facções ou as ideologias representadas pelos deputados legitimamente eleitos. Estaria assim garantido o contraditório e a representatividade plural, cuja autoridade e arquitectura democrática, e cujos equilíbrios de poder, para além do judicial, seriam garantidos no topo da pirâmide pela Instituição Real, cuja isenção e alto valor simbólico produz efeitos nas mais evoluídas democracias da Europa.
Dá-se o extraordinário facto de, após um século de desgraçada república, e ao contrário de algumas decadentes repúblicas europeias, os portugueses possuírem uma incontestável Casa Real, cujo chefe, o Senhor Dom Duarte Pio de Bragança, herdeiro do trono de Portugal, possui legitimidade oficialmente reconhecida em 2006 pelo Governo de Portugal, através do Departamento de Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
É por isso que, para lá de qualquer agenda fantasiosa, estou convicto de que hoje, mais do que nunca, urge reunir tantos portugueses quanto possível na defesa e promoção do seu Príncipe — personificação de uma improvável realização quase milenar chamada Portugal, a ligação transgeracional aos nossos avós comuns, que contra ventos e marés, e por tantos séculos, a souberam dignificar.
Este é um património a defender com todas as nossas energias. Facto que todos nós deveríamos saber merecer, não só com palavras mas com actos, em torno da Causa Real, instituição que tem por missão a defesa do ideal monárquico, da Instituição Real e, no limite, a (re)implantação duma monarquia em Portugal. Uma monarquia para o século XXI, moderna, descomplexada, virada para o futuro: sem pompa ou circunstância, sem corte ou cortesãos. Para resgatarmos a esperança num Portugal com instituições democráticas, representativas, credíveis, inspiradoras — e, sobretudo, mobilizadoras.
Publicado originalmente no jornal i do passado dia 5 de Outubro
Nesta hora difícil que Portugal atravessa, talvez uma das mais difíceis da nossa já longa história, afectando a vida das famílias portuguesas e dos mais desfavorecidos de entre nós, Eu, enquanto descendente e representante dos Reis de Portugal, sinto ser meu dever moral e obrigação política dirigir-vos uma mensagem profunda e sentida, como se a todos conseguisse falar pessoalmente.
Estamos a viver uma terrível crise económica, o nosso país vê-se esmagado pelo endividamento externo, pelo défice das contas públicas e pela decorrente e necessária austeridade.
O actual regime vigora há pouco mais de 100 anos, e muitos dos seus governantes, por acção ou omissão, não quiseram ou não foram capazes de evitar o estado de deterioração a que chegaram as finanças públicas. Tais governantes, é preciso dizê-lo de forma clara, foram responsáveis directos pela perda da soberania portuguesa e pelo descrédito internacional em que caiu Portugal, uma das mais antigas e prestigiadas nações da Europa. Sem uma estratégia de longo ou sequer de médio prazo, sem sentirem a necessidade de obedecerem a um plano estratégico nacional, não conseguiram construir as bases necessárias para um modelo de desenvolvimento politicamente são e economicamente sustentável, optando, antes, pelo facilitismo e pelo encosto ao Estado.
Infelizmente, o Estado, vítima também ele da visão curta com que tem sido administrado, tem permitido que se agravem as assimetrias regionais, que se assista à desertificação humana do nosso território e que fique cada vez mais fundo o fosso que separa os mais ricos dos mais pobres.
Infelizmente, Portugal continua a ser dos países europeus com índices de desigualdade mais altos. Todos têm o direito de ver bem remunerado o esforço do seu trabalho, da sua criatividade, da sua ousadia e do seu risco, mas a ninguém pode ser cortada a igualdade de oportunidades.
Agora, neste momento de particular gravidade, em que nos é pedido um esforço ainda maior, recordo que o Estado é sobretudo suportado pelo fruto do esforço, do trabalho dos portugueses e de muitas das empresas a quem os portugueses dão o melhor das suas capacidades. Todos eles são merecedores do respeito por parte de quem gere os nossos impostos, e é esse respeito, esse exemplo que se exige ao Estado. Não posso deixar de aplaudir a dedicação, a entrega e sobretudo a enorme boa vontade com que inúmeros funcionários públicos se dedicam a servir com dignidade o nosso país.
Mas este diagnóstico e estas constatações valem pouco, valem muito pouco, quando confrontados com as dificuldades com que muitos portugueses hoje se debatem. Um facto é incontornável: a crise está aí e toca-nos a todos, e com ela se vão destruindo postos de trabalho, se vai degradando o nível de vida das nossas famílias e se vão desprotegendo os mais frágeis. Não tenhamos ilusões: muitos são os que hoje só sobrevivem graças à imensa solidariedade de que o nosso povo ainda é capaz. Porque somos um povo generoso, gente de bem, somos um povo capaz de tudo quando nos unimos em torno de um objectivo comum.
Torna-se importante, por isso, lembrar que neste dia, há quase 9 séculos, contra todas as adversidades, nascia Portugal, uma nação livre e independente, fruto da vontade e sacrifício dum povo unido à volta do seu Rei.
Então, como agora, foi fundamental a existência de um projecto nacional, uma causa comum e desejada que a todos envolveu: grandes e pequenos, governantes e governados, homens e mulheres. Um projecto que tinha, acima de tudo, o Rei e os portugueses, unidos por um vínculo indestrutível, constantemente renovado e vencedor, um vínculo de compromisso que nos ajudou a ultrapassar crises avassaladoras no passado, e que se prolongou pelos séculos seguintes, sendo interrompida apenas em 1910.
Foi essa mesma comunhão, uma comunhão de homens livres, que permitiu a reconquista e o povoamento do território, bem como, mais tarde, a epopeia dos descobrimentos e a expansão de Portugal pelo mundo. Foi todo um Povo, o nosso Povo, que enfrentou, com coragem e determinação os mares desconhecidos, "dando, assim, novos mundos ao mundo". Foi a gesta de todo um Povo que permitiu criar este grande espaço de língua e afectos da Lusofonia, vivido em pleno pelas nações nossas irmãs, hoje integradas na CPLP. E foi a renovação desse projecto que permitiu a restauração da nossa independência em 1640, neste local, naquela que foi uma verdadeira refundação nacional, só conseguida pelo esforço e sacrifício dos Portugueses de então.
É pois este o desafio que temos hoje pela frente: refundar um projecto nacional capaz de unir todos os Portugueses de boa vontade, com o objectivo de reerguer Portugal, devolvendo a esperança e o orgulho a cada português. Esse projecto mobilizador é imprescindível para que cada um de nós possa ambicionar ter uma vida normal, socialmente útil, para que possa ser promovido pelo mérito e pelo esforço do seu trabalho, criar uma família e contribuir, cada um na sua medida, para o engrandecimento de Portugal.
Para que este projecto nacional seja possível, teremos de repensar o actual sistema político e as nossas instituições, procurando alcançar uma efectiva justiça social e a coesão económica e territorial, aproximando os eleitos dos eleitores.
Devemos também considerar as vantagens da Instituição Real, renovando a chefia do Estado para restaurar o vínculo milenar que sempre uniu os portugueses ao seu Rei.
O Rei interpreta o sentir da Nação, e age apenas pelo superior interesse do país, e nenhum outro interesse deve também mover os actores políticos. Portugal precisa de autoridade moral, de união em torno de um ideal, Portugal precisa de um projecto que seja o cimento em torno da Nação – a política e, acima dela, a Coroa, deve procurar sempre servir esse ideal, e nunca servir-se dele em benefício próprio.
É num sistema político, moderno, democrático, que a Chefia de Estado, isenta como tem de estar de lutas políticas e imbuída de uma autoridade moral que lhe advém do vínculo indestrutível e milenar com os portugueses, pode e deve zelar pelo bom funcionamento das instituições políticas, assegurando aos portugueses a sua eficácia e transparência. É a mesma Chefia de Estado que pode e deve apoiar a acção diplomática do Governo com o elo natural que a liga aos países lusófonos e a muitos dos nossos congéneres europeus. Acredito que só é possível debater a integração europeia, na sua forma e conteúdo, em torno de um elemento agregador: a agenda própria de um país multisecular na Europa, mas também com continuidade linguística, histórica, social, patrimonial e empresarial em geografias distantes. É o Rei que, personificando a riqueza da nossa história e cultura, é o último garante da nossa independência e individualidade enquanto Nação.
Portugal, nação antiga, com um povo generoso e capaz de grandes sacrifícios, sê-lo-á ainda mais se encontrar no Estado e nos seus representantes o exemplo de cumprimento do dever, de assunção dos sacrifícios e de sobriedade que os tempos de hoje e de sempre exigem. Unidos e solidários num renovado projecto nacional que devolva a esperança aos Portugueses, reencontrados com uma instituição fundacional – a Instituição Real – sempre isenta e centrada no bem comum, então todos nós Portugueses – em Portugal ou espalhados pelo mundo através das vivíssimas comunidades emigrantes – com a grandeza de alma de que sempre fomos capazes nas horas difíceis, estaremos dispostos aos necessários e equitativos sacrifícios que a presente hora impõe. Em nome do futuro de todos os que nos são queridos, filhos e netos. Numa palavra: em nome de Portugal.
Não duvido que, aconteça o que acontecer, os Portugueses, com calma, ponderação e perseverança, saberão lutar para continuar a merecer o seu lugar na história e no concerto das nações. Eu e a minha Família – assim os Portugueses o queiram – saberemos estar à altura do momento e prontos para cumprir, como sempre, o nosso dever, que é só um: servir Portugal.
Existe uma alternativa muito clara à actual situação a que chegou a este regime, alternativa que passa por devolver a Portugal a sua Instituição Real e que, se não resolve por si só todos os nossos problemas actuais, será certamente – como o provam os vários países europeus que a souberam preservar – um grande factor de união popular, de estabilidade política e de esperança coletiva. Numa palavra, de progresso.
Portugal triunfará! assim saibamos unir esforços, assim saiba cada um de nós, de forma solidária, dar o melhor de si mesmo, não esquecendo nunca os que mais sofrem e os que mais precisam. Que ninguém duvide: somos uma nação extraordinária, e o valor e a coragem do nosso povo serão a chave do nosso sucesso.
Neste dia, há precisamente oitocentos e sessenta e nove anos, nascia formalmente o que já se anunciava: uma ideia, um projecto, uma nação que veio a ser Portugal.
Neste dia, oitocentos e sessenta e nove anos depois, é o País que está em risco. Privado de uma fatia importante da sua soberania, e financeiramente dependente do exterior, Portugal encontra-se, perigosamente, à beira de um abismo.
Os dias estão carregados da indignação de quem sofre sem saber para quê, do desespero de quem não encontra alternativa para os seus problemas. Os tempos que vivemos são marcados pela ausência de esperança de todos os que procuram, mas não encontram, uma saída.
Mas ela existe.
Procuram-se saídas sem se olhar para o verdadeiro problema, pois a nossa situação requer soluções muito mais profundas.
Estamos aqui para lembrar que Portugal vive. Que é maior do que a crise, do que as políticas, e muito maior do que quaisquer indivíduos que conjunturalmente nos governem.
Estamos aqui para lembrar que não desistimos da ideia de um Portugal soberano e independente. De um Portugal livre. É o mesmo espírito de união, a mesma ideia e o mesmo projeto que nos anima desde 1143. Portugal não é um desafio impossível nem um problema irresolúvel. Acreditamos que existem soluções. Soluções reais, para causas reais.
Ao contemplarmos o futuro, vemos a possibilidade de uma democracia mais representativa, mais eficaz, mais transparente, uma democracia mais plena, assente num sistema político que sobreponha os interesses de Portugal e dos portugueses aos interesses próprios de cada um, de cada partido. Estamos convictos da absoluta e imperiosa necessidade de termos um país onde os cidadãos recuperem o orgulho da sua identidade e a confiança em quem os representa para que possam realmente viver em liberdade e que em momento algum lhes serão pedidos sacrífios vãos ou injustos.
Olhando à nossa volta, para os nossos parceiros europeus, constatamos que a Instituição Real é o elemento que permite devolver o futuro aos Portugueses, recuperar plenamente a ideia de Portugal, protegendo a nossa identidade, a nossa língua, a nossa história, o nosso futuro, a nossa essência. É nossa profunda convicção que só uma alternativa encimada pela Instituição Real nos poderá libertar de um regime obsoleto, gasto e imposto pela força, que após 16 anos de caos e de infâmia, de 40 anos de autoritarismo paternalista e de 38 de prodigalidade e desgoverno financeiro nos deixou, a todos, falidos e desnorteados.
Só um Chefe de Estado total e verdadeiramente independente de todos os grupos políticos e económicos, e com uma ligação profunda à essência da Pátria, pode garantir uma nação verdadeiramente livre.
Só um Chefe de Estado movido por nenhum outro interesse que não seja o interesse nacional pode ser o efectivo garante do regular funcionamento da democracia, assegurando a separação de poderes de um Estado de Direito, ao mesmo tempo que se submete constantemente ao escrutínio dos Portugueses.
A Chefia de Estado que o regime monárquico defende é a que melhor compreende o presente, oferecendo um olhar renovado para o futuro onde Portugal e os Portugueses estarão, garantidamente e sempre, em primeiro lugar.
É hora de pensar com ambição e esperança.
É hora de oferecer a possibilidade de dias mais luminosos.
É hora de sermos audazes e de encontrarmos de novo um sentido para o nosso país que hoje cumpre oitocentos e sessenta e nove anos de vida.
Apelamos ao povo português para que pense, sem preconceitos, sem utopias, sem demagogia, na alternativa que apresentamos. Uma alternativa real.
Porque somos consequentes com este manifesto – e porque estamos convictos de que é na Instituição Real que reside o futuro de Portugal – assumimos o firme compromisso de ir ao encontro dos portugueses, em Portugal e no estrangeiro, para esclarecer todos os cidadãos das características e benefícios de uma monarquia para o Portugal que gostaríamos de ter no século XXI.
É nisto que acreditamos, é isto que defendemos. Pela restauração de Portugal, com o mesmo entusiasmo que guiou as vontades de quem viveu este dia, há oitocentos e sessenta e nove anos.
A Real Associação de Lisboa é uma estrutura regional integrante da Causa Real, o movimento monárquico de âmbito nacional. Esta é uma associação que visa a divulgação, promoção e defesa da monarquia e da Instituição Real corporizada na Coroa Portuguesa, cujos direitos dinásticos estão na pessoa do Senhor Dom Duarte, Duque de Bragança e em quem legitimamente lhe vier a suceder. Cabe a esta associação a prossecução de iniciativas e de projectos de interesse cultural, social, assistencial e de solidariedade que visem a dignificação, a valorização e o desenvolvimento dos seus associados e da comunidade em que se insere.